Aos necessários dias de consciência negra e o nosso futebol de cada dia
Escrito por Eduardo de Oxalá em 17/12/2021
O dia 20 de novembro resgata a memória de rebeldia de Zumbi dos Palmares, que aprendeu a defender uma estratégia de poder usando várias formas e técnicas de resistência. – Gorivero / Wikicommons
A luta pela democracia perpassa também pela luta da democracia no futebol
Beni CarvalhoBrasil de Fato | Salvador (BA) | 30 de Novembro de 2021 às 10:38
No dia 20 de novembro celebramos com luta o dia da Consciência Negra. Ainda que esta seja cotidiana para aqueles e aquelas que resistem diariamente a esse sistema brutal, que mantém as suas garras sobre nós trabalhadores e trabalhadoras negros e negras, a data é para nós um dia em que devemos sempre reforçar a nossa rebeldia necessária. Assim como foi o dia 04 de novembro, quando celebramos para reforçarmos a rebeldia necessária (nos seus princípios, teoria e concepção política) de um negro amante do futebol, marxista-leninista, Carlos Marighella, o dia 20 traz a memória de rebeldia de Zumbi dos Palmares, que aprendeu a defender uma estratégia de poder usando várias formas e técnicas de resistência que acabaram contribuindo com o desenvolvimento cultural da sociedade brasileira.
A luta racial é de interesse do proletariado brasileiro, pois o racismo tem em seu âmago contradições irresolvíveis no capitalismo brasileiro, assumindo sempre dimensões explosivas. Por isso, é de nosso interesse fortalecer e intencionalizar uma política que estimule todos os espaços sociais que enfrentem a questão racial enquanto sua dimensão dialética na classe trabalhadora brasileira.
As denúncias que os trabalhadores, as trabalhadoras e o movimento negro vêm estimulando para garantir a revelação das barbaridades históricas e vigentes contra os corpos negros/as estimulam a luta racial no futebol, que retroalimenta essa resistência cotidiana. Nesse conflito cotidiano, no dia 16 de novembro, infelizmente presenciamos um ato racista contra a jogadora Adriana do Corinthians, pelas adversárias do Nacional do Uruguai, em partida válida pela libertadores. Mesmo tendo havido reação a partir dos protestos das jogadoras corinthianas, lamentavelmente o jogo teve a continuidade dada pela equipe de arbitragem.
Em outro episódio, foi constatado atos racistas cometidos pelo conselho deliberativo do Brusque Clube contra o jogador Celsinho. O caso foi passível de punição, no entanto, no dia 18, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva – STJD absolveu e garantiu a recuperação de três pontos do citado clube da série B do Brasileirão. Celsinho manifestou publicamente seu repudio à decisão retrógrada.
O futebol, como em diversos âmbitos das nossas relações sociais, é articulado por uma estrutura econômica que orienta as formas de produção, socialização e de dominação a partir de uma política com orientação de classe.
Num momento em que o capitalismo necessita aprofundar a exploração dos trabalhadores/as e diante da crise de destino do conjunto da classe e suas representações, crise essa demonstrada na política federal do Brasil e no controle da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), torna-se necessária para o sistema a política retrógrada e violenta contra o nosso povo. Sendo assim, tanto o governo federal quanto a CBF apostam na espetacularização, na ausência de investimentos, na corrupção, no autoritarismo, no ataque à democracia e no reforço do racismo enquanto condução da superexploração.
Os negros, enquanto sujeitos historicamente dominantes na qualidade e na quantidade, no futebol estão sujeitos às péssimas condições de trabalho. Segundo estudo “Impacto do Futebol Brasileiro” realizado pela consultoria da Ernst & Young para a CBF em 2020, 55% dos jogadores de futebol masculino brasileiros (é importante levarmos em consideração que, dessa porcentagem, a maioria são homens negros) recebiam menos de um salário mínimo; em contrapartida, apenas 1% recebiam acima de 500 mil reais. Esses dados nos mostra como a crise social impacta ainda mais muitos trabalhadores, agravando as condições dos negros, em especial as mulheres negras, que teriam possibilidade de se desenvolverem no futebol, porém, a ausência das condições mínimas de sobrevivência afastam esses trabalhadores/as das condições plenas do desenvolvimento da cultura esportiva do futebol, e assim vai se destruindo os e as “artistas da bola”, ao passo que o futebol brasileiro vai se concentrando nas mãos de burgueses e pequenos burgueses neofascistas que, baseados na espetacularização, racismo e patriarcalismo, submete a maioria ao projeto político deles.
Por fim, reforçamos que a luta pela democracia perpassa também pela luta da democracia no futebol e por uma estratégia política que possa lograr os trabalhadores e trabalhadoras ao objetivo da conquista do poder político, para que possamos impor também os nossos interesses no futebol brasileiro, que estimule o desenvolvimento pleno da nossa cultura e arte com igualdade econômica e política. Para isso, é necessário reforçarmos sempre a rebeldia necessária de Zumbi, Dandara, Marighela, Lélia Gonzalez e muitos outros e outras que são nossa eterna inspiração por um mundo de poesia, futebol, samba/forró e revolução.
Edição: Jamile Araújo